sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Dia 13 de outubro-Abertura da minha exposição no Original Beto Batata no Alto da XV.
Rua Professor Brandão 678.Pinturas, desenhos, serigrafia e meus relatos poéticos...
Apareçam para conferir...

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Caligrafia de Julieta
A imaginação sempre lhe ofereceu imagens mil para deliciar-se.O mais delicioso dessa brincadeira, era que o imaginar quase se transformava em viver aquilo com toda intensidade e veracidade.
Ela era uma pessoa muito distinta e gabava-se de um imaginário tão rico e fértil. Ele o acompanhava desde a infância, quando descobria desenhos na junção das linhas e arabescos do azulejo, ou nos desenhos que seus cabelos insistiam em brincar de fazer no chão do box, aos seus pés, ou mesmo ao seu lado. Bastava virar-se sutilmente e podia perceber toda a composição que a junção dos desenhos dos azulejos faziam,
Mas dentre todas as situações imaginadas, a que mais nutria em si e mais ansiosamente esperava, era o encontro com suas fantasias através da figura de um homem.
Em seu quarto,escondida em seu canto, pensava como seria a textura da pele do homem que pela primeira vez colocaria a mão sobre a sua, com pura inocência, sentindo aos âmagos todas as sensações que aquele toque poderia lhe despertar
Poderia ser tarde, o momento em que suas peles se encontrariam , talvez daqui uma década, ou mesmo 50 anos, já que do destino nada se espera, ou tudo se espera.
As imagens a cada ano eram enriquecidas de detalhes e mais detalhes. E um sutil detalhe, que supostamente em nada alteraria a composição como um todo, poderia através de impulso transformar-se no maior segredo revelado.
Era um jogo frenético e perigoso esse que fazia, oscilando entre a fantasia e a realidade, sem remorso algum. Fazia-lhe falta seus devaneios em meio a tardes ensolaradas de céu de brigadeiro. As imagens tomavam-lhe de tal forma que poderia simplesmente olhar para tudo, principalmente as coisas que mais lhe agradara, por noites a fio, sem som, na volúpia de um sono contido para melhor poder ver as maravilhas da natureza e as cores que surgiam na mudança das estações.
Eram tantas coisas que desejava, que receava não poder ter todas. Estava frustrada, desanimada, e já havia desacreditado em possíveis histórias saudáveis e instigantes. Vinha de um longo período de desilusões e relacionamentos covardes, não por sua parte. Tinha mania de pensar e logo escrever tudo no passado. Escrever era um de seus prazeres, e o fazia de maneira a ocultar que a personagem principal era ela e os outros elementos figuras de linguagem, para delicadamente contar sua história às espreitas, entre aspas e conjugada no passado.Escrita de forma as pessoas imaginarem que era apenas um conto de fadas contada por uma tola que ainda acredita em amor e nas pessoas.
Tinha medo de assumir para si a história e a posição de uma eterna sonhadora romântica, portanto inventara até um nome para a personagem que viria a sentir suas angustias, declarar seus segredos, mantendo um certo mistério e sentir seus medos, como uma dublê a que tudo topa.
Tinha agora o que mais desejava: alguém para viver em seu lugar, experimentar todas as possibilidades do existir, cometer erros em seu lugar, fazer declarações de amor, reclamações, insultos, soltar gritos de desespero.
O fato de ter uma personagem para viver tudo para ela, lhe soava tão confortante, que já havia se diluído na personagem criada.Era ela Clarice.
Clarice era uma mulher alta, corpo esguio, pele branca feito névoa, e cabelos ruivos e enrolados, com cachos pendendo sob seus ombros.Era de uma delicadeza tamanha e ao mesmo tempo de uma intensidade e gênio que metiam medo.Assemelhava-se à uma loba, e adorava cultuar os animais selvagens.Era ela uma mulher de muita agilidade e atitude.Nada temia e fazia graça dos medos alheios. Conforme foi criando a personagem , foi se misturando à ela, de maneira à quase pensar que era a própria.
Eu, Clarice, a personagem, enfim, nossos eus misturados em um único ser,chegamos à conclusão que ainda amamos, temos os mais loucos devaneios sobre possibilidade de histórias de amor e adoramos ler cartas de amor alheias, e principalmente respondê-las, fazendo assim, histórias e mais histórias acontecerem , pessoas se reencontrarem, se redimirem , e apaixonarem-se novamente. Sei que podemos parecer invasivas, respondendo correspondência alheia. Mas o fato de podermos interferir positivamente nelas, nos enche de um gozo explêndido, sentido aos âmagos.
Mais prazeiroso ainda, é saber que nossa caligrafia traz lembranças de um tempo em que as pessoas se correspondiam, trocavam segredos, declarações, um tempo em que existia um mundo de afeições em uma letra bem desenhada e delineada. Um tempo em que as pessoas identificavam as outras pelas letras, e os amantes, ao identificarem a letra de seu amado, suspiravam e susurravam sozinhos.